Acordei com muitas dores, mal
conseguia me mexer. Se para eu me deitar era difícil, me levantar era pior
ainda. No entanto, sabia que Jesus — aquele que ensinava, amava, curava,
cuidava, sorria e se importava com qualquer pessoa, saudável ou enferma —
estaria ali. Eu precisava ir, mas não conseguia me levantar!
Quando menos percebi, as
delicadas e calosas mãos de uma amiga, se apresentaram a mim. Junto às mãos,
uma voz firmemente delicada: “Levante, Jesus está na sinagoga, você precisa ir
até lá, vou com você”. Se antes eu ainda estava em dúvidas por conta da dor, o
afeto e a força da minha amiga me animaram de um jeito maravilhoso. Eu não faço
ideia de como consegui me colocar em pé tão rapidamente. Me arrumei e fomos até
Jesus.
Eu sabia que veria Jesus, mas
sabia também que lá estariam todas as pessoas que me atormentavam e me
desprezavam por conta dessa enfermidade. Se meu corpo estava encurvado, minha
alma também foi se encurvando, dia a dia, por conta do desprezo e do
preconceito. Ninguém falava comigo, mas muita gente falava de mim.
Jesus falou comigo. Sua voz
inesquecível me abraçou de forma que eu não resisti. Deixei de lado a vergonha,
o medo e até a dificuldade de locomoção. Me aproximei dele. À sua voz uniu-se o
seu toque: “Mulher estás livre”, foi o que ouvi. Foi o que senti… foi o que
vivi. Ereta e desperta, eu glorificava a Deus.
Nada discreta foi a postura do
chefe da sinagoga. Seu olhar me ignorava, mas suas palavras tinham destino
certo: encurvar-me mais uma vez. Ele não conseguiu. Enquanto eu glorificava a
Deus, a glória divina se manifestou: Jesus começou a falar! As palavras de
Jesus endireitavam a vida de quem, assim como eu, havia se encurvado diante das
agruras do mundo.
Ao se deparar com a arrogância do
chefe da sinagoga e de mais alguns religiosos, que com olhar de reprovação
desprezavam a beleza do momento, Jesus lhes confrontou: qual de vocês não
soltam o seu animal sedento para beber água, mesmo sendo sábado? Diante do
silêncio que pairou após sua pergunta, ele prosseguiu: por que motivo eu não libertaria
essa filha de Abraão de uma prisão que já durava 18 anos? Ninguém conseguia
respondê-lo.
Com essas perguntas que nos
respondia, Jesus mostrava a mim e as outras mulheres que nós também éramos
herdeiras da promessa! Naquela época as mulheres não eram chamadas de filhas de
Abraão, isso era privilégio para os homens, mas era hora de ressignificar...
Jesus nos mostrava que embora os
homens nos considerassem como propriedade, até mesmo inferior a um animal. Ele
nos enxergava e valorizava como seres humanos, nada menos que isso. Ali eu
fortaleci não só a minha coluna, mas a minha postura de não deixar que ninguém
me diminuísse, nunca mais. Eu não seria menos que uma mulher livre, como Cristo
havia me definido.
Todas às vezes que as agruras da
vida, a violência cotidiana, o olhar preconceituoso, a solidão, a desconfiança
da minha capacidade, querem me encurvar, as palavras de Jesus ecoam: mulher
estás livre! Livre para celebrar, para aprender, para ensinar, para construir
outras relações mais saudáveis comigo e com quem convivo.
Estou livre para olhar para onde
eu quiser. Já não preciso ter o olhar apenas direcionado para o chão. É
possível olhar o céu, o horizonte e o passado por isso, percebi que era
possível olhara para as mulheres que comigo, caminham.
Não posso me alongar mais,
preciso me despedir. Hoje é sábado, e tenho que ir à casa de algumas mulheres
para levá-las à sinagoga. Agora sou eu que sigo sendo aquela mãe amiga e firme,
que me levantou para viver o dia que me transformou.
Um abraço carinhoso de quem agora
pode livremente abraçar,
A mulher Erguida
[Elaborada para o Encontro de Mulheres da Igreja Metodista de Vila Mariana, 07/03/2020]
[Elaborada para o Encontro de Mulheres da Igreja Metodista de Vila Mariana, 07/03/2020]
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