Ontem,
acordei com a notícia que o deputado Márcio Labre, PSL/RJ, protocolou um
projeto de lei que previa a proibição de alguns métodos contraceptivos, entre
eles DIU e a pílula do dia seguinte. Me indignei? Sim, falei comigo e com o
celular, esbravejei com o espelho enquanto eu me arrumava para trabalhar, levantei,
saí, vivi...
A
noite chegou e, com ela, minha segunda jornada de trabalho. Depois de 4 anos
longe de uma sala de aula, voltei a dar aulas, fui para a faculdade. O curso?
Pedagogia. Saí da faculdade, peguei o metrô. No percurso, me encontrei com uma
mulher que chorava seu recém aborto. Em meio à culpa, solidão, sentimento de fracasso,
começamos a dialogar. Fui até a última estação do metrô com ela, conversamos, choramos
juntas, nos indignamos, falamos de Deus, da vida, da morte, das crianças e dos homens,
falamos com Deus, falamos, falamos. Foi muito bom ter ido para além do meu
destino, do meu conforto, da minha rotina. Foi bom ter caminhado mais de uma milha.
Ela se foi, eu me fui.
Ontem
não consegui dormir, e não foi por causa da notícia de um projeto de lei de um
homem sem compromisso com as mulheres e com a vida real. Foi por encontrar uma
companheira, por encontrar histórias que se repetem e me deparar com os
desafios que a sororidade exige. Entre eles: fazer nascer nela e em mim, a
possibilidade de recomeçar e combater a culpabilização e o domínio sobre os
corpos das mulheres.
Enquanto
ela se apropriava da culpa do aborto, da fraqueza por não ter conseguido dizer
não ao companheiro, da raiva por não ter sido forte em permanecer grávida, da
vergonha de Deus, eu sentia o desejo de lhe mostrar outros lados da mesma
história: o fato de que seu parceiro, nada companheiro, também havia abortado e
que não se sentia e nem seria culpabilizado por isso; a necessidade de que a
culpa não abortasse nela a esperança de recomeçar, de caminhar para além, de
sonhar com outras possibilidades.
Tem
dias que “um dia” vale realmente mil anos e, para vivê-los da melhor maneira
possível, a gente precisa se inspirar em Jesus e na sua opção de ressignificar
as leis levando em conta a vida, especialmente a das pessoas oprimidas.
Não
era uma sinagoga, era um metrô. Não era a mulher encurvada do Evangelho de
Lucas (13.10-17), mas era também uma mulher cabisbaixa, sofrida, dolorida. Não
era um fariseu, era um deputado do PSL. Era eu, que preferi rememorar no
coração, as palavras de Jesus naquele episódio: “mulher, você está livre da sua
enfermidade” (v.12).
Assim,
sigo eu, no meu encontro divino com o cotidiano, com as pessoas, com a vida, as
dores e as esperanças. Sigo eu, partilhando esse texto para que nós tenhamos a coragem
cotidiana de caminhar para além da nossa zona de conforto, ressignificar nossas
convicções sobre vida digna, igualdade e respeito.
Que
as nossas palavras, assim como as de Jesus naquele episódio de Lucas,
envergonhe os fariseus e alegre o povo: “Tendo Jesus dito estas palavras, todos
os seus adversários ficaram envergonhados. Entretanto, o povo, se alegrava por
todos os feitos gloriosos que Jesus realizava” (Lucas 13.17).
Eu
quero me alegrar e ser instrumento de paz, liberdade e alegria.

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