Maria: improváveis e impossíveis de mãos dadas com a esperança e a confiança.

Amanheceu e os primeiros raios de sol acariciaram o rosto da jovem que, ainda que tivesse dormido pouco, se pôs em pé. Com ela, levantaram-se todos os acontecimentos que entranhados em sua memória, faziam-na perceber que não fora um sonho. Tudo havia de fato acontecido!

Um anjo, um anúncio, um filho, era isso que tomara o lugar dos preparativos para a festa de casamento. Encontrar alguém era preciso e foi nessa direção que Maria caminhou. Isabel, que também estava grávida e vivia a novidade da vida, gerada em meio à esterilidade, era quem Maria esperava encontrar.

Lá se vai a jovem e cada pedrinha e flor encontradas no caminho, a faziam pensar sobre o perfume e a dureza desse novo projeto. Gerar a Vida vai para além de ser um privilégio, implica responsabilidade, cuja etimologia significa responder com habilidade.  Respostas fáceis essa gravidez peculiar não lhe havia dado. Perguntas, essas sim, devem ter surgido aos montes dessa incomum experiência.

Um olhar amigo é como um oásis em tempos de deserto. O oásis, antes de qualquer coisa, está ali para receber, acolher, refrescar. O abraço e o afago de Isabel foram mais refrescantes do que o suco de uvas com folhinhas de hortelã que talvez ela tenha oferecido à Maria. A alegria de Isabel também acolheu Jesus.

O bebezinho era divinamente entretecido no ventre de sua mãe e já começara a ter seus sentimentos formados, provara da surpresa, do medo, da alegria e agora era hora de viver a proteção. Ao proteger Maria, Isabel protegia Jesus. Da surpresa do encontro brotou a alegria da chegada. Na paz do abraço, os bebezinhos se aninharam e se animaram. E nessa alegria, Isabel exalta a mais hábil resposta de Maria: “Bem-aventurada a que creu, porque lhes serão cumpridas as palavras que lhe foram ditas.” (Lucas 1. 45).

Crer é dar crédito, é afirmar que se tem convicção sobre a veracidade do que a outra pessoa diz. Ao crer, Maria se permitiu gerar Jesus. Houve fecundação no nascimento de Jesus Cristo. O óvulo fecundado pelo Espírito Santo tinha em sua carga genética a confiança e a esperança que vencia o medo. A semente do Espírito encontra na fé a boa terra para crescer. 

A euforia da acolhida dá lugar a prosa. Entre a partilha de sintomas das gravidezes, a perplexidade do milagre e as ideias preconcebidas sobre a criação das crianças, aquelas mulheres dialogavam sobre a vida. A jovialidade de Maria refresca Isabel, a maturidade de Isabel aquece Maria e assim, nesse diálogo de gerações, as experiências partilhadas vão forjando as mulheres e as crianças, dois meninos que nascerão embalados pela amizade das suas mães e comprometidos com o bem comum. 

Foram três meses de prosa, tarefas domésticas e sonhos partilhados. Três meses de cantoria, de alegria, de lágrimas e de tudo mais que suscita uma existência humana comprometida com confiança e a esperança de colaborar no projeto do bem comum, do bem viver.  As amigas, mais unidas do que nunca, com esperança e confiança, agora se separam para que a vida siga: Isabel dá à luz a João Batista e Maria sai a encontrar José e a esperar Jesus.

Confiança e esperança compõem o solo onde o primeiro presépio foi sendo construído. José preferiu dar crédito às palavras do Anjo ao invés de valorizar os julgamentos machistas que poderiam vir de seus amigos e de sua família. A esperança que inundou Maria fez com que sua alma engradecesse ao Senhor. Ela cantou, assim como Ana, o fato de ter visto a economia do Reino de Deus prevalecer sobre a economia do império: celebrava-se a força da justiça e os protagonismos das pessoas oprimidas, da humildade, da singeleza. Celebrava-se a Deus! Celebrava-se as mulheres! Celebrava-se as crianças! Celebrava-se os pobres!

Os pastores do campo venceram o medo e, em confiança à mensagem angelical, foram até Belém ver a fonte de paz; os rebanhos, confiados em seus pastores, com eles caminharam. Por esperança, os reis magos viajaram muito para adorar o menino que acabara de nascer; por confiança, eles creram no sonho após o encontro e mudaram de caminho. Dessa forma, construíram outra realidade: preservar a vida do pequenino.

Não dar crédito ao preconceito, engrandecer e agradecer a Deus as bênçãos recebidas, buscar vencer o medo, encontrar-se com amigas e amigos que nos acolhem como oásis, seguir acreditando, como diria Paulo Freire no direito e no dever de mudar o mundo, sonhar com outras rotas para proteger a vida de pessoas inocentes, são respostas hábeis que também podemos dar. O Natal de Jesus nos educa a nascer para isso no novo ano que o segue. Fácil não é, mas possível, sim. A esterilidade de Isabel deu lugar ao impossível, a hospedaria lotada deu lugar ao improvável. Impossível e improvável são os melhores lugares onde a esperança e a confiança podem florescer.


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