No caminho de Emaús...

Da normalidade à realidade

(Ao meu amigo Ed e sua amada Luciana)

Esse não é um bom título para uma das mais belas passagens bíblicas, pelo menos assim a considero, muitos títulos vêm a minha cabeça, mais opto pelo que acho atraente: da normalidade à realidade.

 É sempre bom optar pela realidade. Um choque de realidade foi o que acontecera, o choque da morte de Jesus havia feito tudo voltar ao real, ou seria ao normal? Nem sempre é bom voltar ao normal, porque as normas quando bem atadas nos enlaçam e podem nos tirar do real. Assim sendo voltemos à realidade do texto.

Iam para Emaús, a mudança de rota se deu por desencontro, por des-esperar. A dor que vinha daí acabou por sequestrar a vida de Cleopas e da outra pessoa que com ele andava.
Há pesquisas bíblicas que apontam a possibilidade de que a pessoa que andava com Cleopas, não fosse um discípulo, mas uma discípula: sua mulher. A norma que me perdoe, mas é tão mais real ver Jesus se aproximando e se revelando em igualdade ao masculino e feminino, a totalidade da humanidade. Assim assumo: era Cleopas e sua
mulher, que por motivos normais daquele tempo, não teve seu nome revelado.

O que se sabe que em tristeza e angústia caminhavam quando o Companheiro do Caminho se colocou junto. A princípio Ele ouvia as dores, o que será que conversavam para além do que está no relato? Além do que houvera em Jerusalém, pode ser que que outros assuntos tenham tomado o diálogo, a lista de compras da semana? O reparo no telhado? Uma rusga aqui e outra ali podem ter surgido, afinal, havia tensão na realidade...

Jesus, em realidade, sem nenhuma normalidade, se coloca no caminho, escuta as dores, os lamentos e até mesmo as simples querelas domésticas. O casal em sua normalidade, não enxerga a realidade, ele e ela escutam o Mestre mas não o reconhecem.

O Companheiro do caminho vai, aos poucos, convidando a dupla para a realidade: a Palavra viva que desceu dos céus, cuida de cada palavra a ser dita na conversa. É em meio aos suaves e duros verbetes que esse convite chega: vocês não lembram o que ensinou as Escrituras? Não se recordam do que os profetas falaram? Das palavras escritas por cada ser humano chamado por Deus a registrar a realidade no santo livro? Pelo visto e ouvido, ele e ela não se lembravam...

A caminhada para a normalidade já estava chegando ao fim, já estavam em Emaús. O Companheiro do caminho fez menção em passar adiante, mas é convidado a entrar. Era hora de suprir necessidades reais: a fome, a sede e o cansaço.
 
A mesa posta é o melhor lugar. É a mesa que o salmista entende o valor da união: como é bom e agradável que os irmãos e irmãs sentem- juntos à mesa e façam suas refeições. Ali o Senhor ordena a bênção. Essa é a tradução que se aproxima da realidade.

O gesto concreto de partir o pão finaliza o que começou lá no coração: os olhos se abriram. É preciso ter olhos abertos para enxergar a realidade, porque a normalidade deseja e precisa de olhos fechados.
E realmente...o que havia na realidade? A mesma estrada com o caminho inverso: era preciso retornar para a realidade. Bem cedinho se levantam, Cleopas prepara a refeição e sua mulher a marmitinha que alimentará o estomago. Com o coração satisfeito, lá vão eles a caminho de Jerusalém, a caminho da realidade. 

No caminho, mais partilha de idéias, o diálogo sempre ajuda a chegar onde queremos. Conversas domésticas, alertas sobre o comportamento: Cleopas tenha cuidado quando for dar a notíciaMulher não fica me controlando, coisas da realidade... mas no diálogo não havia só isso, tinha também a Palavra e o discernimento de que ela era, de fato, real. Ela fora, aos poucos, descoberta no caminho e agora fortalecia e unia os passos em direção a realidade.

Diz-se por aí que é no casamento que se descobre a realidade. Eu acredito nisso, mas tenho quase certeza de que no som dessa frase vem, muitas vezes, o sentimento do des-esperar, então muda-se o significado: é no casamento que se descobre a normalidade.  Acho que é isso que algumas pessoas desejam dizer.

Meu conselho aqui é outro: cubram a normalidade e descubram a realidade. Nesse caminho, o Companheiro aquece o coração, abre os olhos e muda a direção. Nesse caminho traçado por duas pessoas que se amam, segue o desafio de sentar-se à mesa, comer e dialogar, levantar e se ajudar, ter sempre na marmita diária o alimento maior: a Palavra de Deus, e seguir descortinando a realidade, nesse exercício vocês perceberão que é a realidade o terreno que os sonhos procuram para florescer.

Quem casa escolhe caminhar junto, assim sigam se amando e andando na certeza que o Companheiro do Caminho sempre estará junto.

Um beijo no coração de vocês que agora batem e seguem juntos....
Andreia

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