Já já chega 2015! O frisson pela novidade é cada vez mais intenso, o desejo de abandonar
o velho abre as portas para o encontro com o novo, que com seu frescor colore o
nosso olhar, esperança a vida, fertiliza a imaginação e deixa, pra mim, um
gosto de caqui na boca, hum...que delícia!
Eu quero o novo, eu quero
muito o novo! Só que nesses dias de festa quando voltei para casa dos meus
pais, tenho pensado nisso a partir da nova experiência de me encontrar com o
velho.
Falo do encontro com a
minha avó, 89 anos, dores, esquecimentos, histórias antigas, cansaço e tudo
mais de novo que a velhice vem trazendo. Não tenho a intenção de escrever um
texto derrotista às vésperas do novo ano! Só que acho que o afã do novo, por
vezes, cansa a vista a ponto de não se enxergar nada além disso e, assim, falar
do que é velho fica démodé, para usar uma expressão do tempo da vovó.
Com a minha avó aprendi a
usar o shampoo Colorama que nem existe mais, aprendi a amar arroz doce e
manjar, aliás posso rodar o mundo e nunca vou achar nada parecido com os que
ela fazia. Aprendi a sentar na calçada às 5h da tarde, de banho tomado, para esperar
minha mãe chegar do trabalho e me levar pra casa. Enquanto a mãe não vinha, a
minha boca saboreava a cana de açúcar cortadinha e geladinha que sempre tinha
por lá.
Entendi que eu tinha que
defender minha família. O primeiro episódio que lembro tem a ver com ela: eu
tive que enfrentar uns meninos na rua que cantavam "taca pedra na
Geni", sim é esse o nome da minha avó e até hoje detesto essa música.
Com a vó Geni não aprendi a
gostar de nenhum livro ou coisa do gênero, ela não sabe ler nem escrever, mas
até hoje se orgulha do fato de que meu avô trabalhou como ascensorista no
Ministério da Educação. Além do “engraçado” medo de trovão, muito mais coisas
ela me ensinou e que estão por aqui, dentro de mim. Ainda hoje, sem ter ideia,
ela me ensina.
Por esses dias assumi boa
parte da responsabilidade de cuidá-la. Colocar fraldas, arrumar o prato de
comida, dar água, ajudá-la a se movimentar estão na minha rotina nesse tempo.
Sem contar as histórias que escuto e que já conheço de trás pra frente. A que
eu mais gosto é a do dia do casamento: não houve festa, há apenas um retrato e
a celebração foi a primeira e única ida ao cinema em Vaz Lobo, subúrbio do RJ.
Como se contentar com tão pouco?
Hoje, na hora do seu banho,
enquanto eu ensaboava seu corpo, parece que tocava no meu, percebi que algumas
curvas minhas estavam ali... minhas lágrimas se misturavam aos respingos de
água que caiam no meu rosto...eu me via na minha avó. Não por maneiras de
falar, se portar ou coisas do tipo, eu me via nos desenhos do seu velho corpo...Nesse
último dia do ano “velho”, é assim que surge o novo pra mim.
Esse último ensinamento de
2014 chega em mim como novidade para o próximo ano que, entre fogos, rabanadas
e orações, já bate à porta. Quero que o novo seja a continuidade da história
que dia a dia, fio a fio sigo a tecer, quero transformações como frutos de um
olhar cuidadoso do já vivido.
Não se deve ter medo de
usar e encarar a palavra velho e seus derivados. Por vezes as expressões:
terceira idade, feliz idade e afins, se transformam em refúgio para dar novas
roupagens aos nossos medos. Quero que o tempo novo apure o meu tato para
reconhecer em meu corpo cada etapa já vivida, desejo o meu passado na minha
memória para que meus pés sejam guiados por novos caminhos. Pretendo que os novos
sorrisos, lágrimas e carinhos que vêm por aí, sejam valorizados porque ainda
não fazem parte da minha velha história.
Assim celebro a vida,
agradecendo a Deus por cada pessoa que encontrei na construção da minha
história. A quem quer que leia esse despretensioso texto, desejo os meus mais
sinceros votos de que o novo ano seja cheio de possibilidades de esperanças
pelas novidades que chegam e gratidão pelo já vivido.
Que a novidade não nos tire
a vontade e a coragem de encontrar-se com o que já existe dentro de nós, nem
tampouco nos apresente desvios de caminho para não levar em conta de que o que
realmente há de novo é o acréscimo de mais etapas em nossas vidas. Vamos
vivendo a novIDADE de envelhecer, não há demérito nisso. Feliz ano NOVO!
Obrigada vovó, por me
apresentar um novo caminho para o ano de 2015,
Andreia.
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